A mais romântica de todas as óperas?
“LA BOHÉME”, DE PUCCINI
É “romântica”, sentimental, mesmo piegas,
na opulência melódica de uma orquestração habilíssima,
em que não há recurso desonesto da escrita musical
que não seja usado para enternecer
ou para fazer sorrir um satisfeito sorriso triste
por conta da “tragédia” inevitável,
com vidas fáceis, muita miséria alegre,
o “quantum satis” de imoralidade, e o bacilo
de Koch, herói do Romantismo. Mas…
jamais se foi tão ao fundo da vulgaridade,
jamais se comoveu tanta gente dura com a realidade,
transformando-as em convenções tão líricas.
E jamais tão bem se anestesiaram as pretensões de gosto
com esta coisa tão simples
que é como que bondade,
como que tristeza,
como que morte,
e é uma fúria de fugazmente viver,
sensível, inútil, condenada,
mas que sempre pungente viverá nesta música.
E, quando cai o pano sobre a morte de Mimi,
mal sonha a maioria dos espectadores conspícuos
a que ponto, com a lágrima no olho,
pagaram a conta do café aos Marcelos e aos Rudolfos,
e compraram sapatos mais largos a Museta.
E isto faz que perdoemos a Puccini tudo,
e lhe concedamos o lugar que merece em nós
como o coração que perdemos, e ele,
sem vergonha e sem escrúpulos,
nos restitui.
26/7/1964
Jorge de Sena in Arte de Música
Julgo que não será necessário descrever detalhadamente o argumento da Bohéme. Quem não estiver bem dentro do assunto, poderá sempre consultar um dos inúmeros sites sobre ópera que facilmente se encontram através do Google.
Gostaria que ouvissem a célebre área de Mimi-“Si, mi chiamano Mimi”- e o dueto “O suave fanciulla”.
(Para situar a acção, apenas uns breves dados: Mimi, vizinha de Rudolfo, bate à porta deste porque a sua vela se apagara. Rudolfo convida-a a entrar e dá-lhe um copo de vinho para a reanimar, pois Mimi estava quase desfalecida. Ao levantar-se para sair, ela descobre que perdeu a chave. Rudolfo encontra-a facilmente, mas mete-a no bolso para ter um pretexto para reter Mimi. Então toca-lhe na mão, que está muito fria, e canta a área “Che gelida manina”, na qual faz a sua apresentação, e que termina com as palavras “Chi siete? Vi piace dirlo?”
Respondendo a Rudolfo, “Si, mi chiamano Mimi”, é agora a vez de Mimi se apresentar, dizendo o seu nome e falando da sua vida e gostos.
Seguidamente, os dois cantam o dueto “O suave fanciulla” e saem juntos, acabando assim o 1º Acto.)
A área começa com o “tema de Mimi”, que irá percorrer toda a ópera associado a esta personagem, e que se ouve durante os primeiros versos.
Depois, com a frase “mi piaccion quelle cose” ouve-se um novo tema de sabor oriental (atenção ao trilo de flautas seguido de um acorde mais forte).
Há depois uma pequena pausa, durante a qual Mimi faz uma pergunta “ Lei m’entende?” e recebe a resposta de Rudolfo “Si”.
Seguidamente volta o “tema de Mimi”, logo seguido por outro de carácter pastoral, apropriado à descrição que ela faz da sua vida simples.
Dá-se então o clímax da peça e volta-se a ouvir, por momentos, o tema oriental. A área acaba de um modo suave com duas frases faladas.
Área de Mimi interpretada por Maria Callas:
O dueto é baseado no tema já antes utilizado nas áreas anteriores.
Dueto “O suave fanciulla” interpretado pelo casal A. Gheorghiu/R. Alagna:
Link para o site de Angela Gheorghiu (pode ouvir-se no site a parte do clímax da Área de Mimi)
É “romântica”, sentimental, mesmo piegas,
na opulência melódica de uma orquestração habilíssima,
em que não há recurso desonesto da escrita musical
que não seja usado para enternecer
ou para fazer sorrir um satisfeito sorriso triste
por conta da “tragédia” inevitável,
com vidas fáceis, muita miséria alegre,
o “quantum satis” de imoralidade, e o bacilo
de Koch, herói do Romantismo. Mas…
jamais se foi tão ao fundo da vulgaridade,
jamais se comoveu tanta gente dura com a realidade,
transformando-as em convenções tão líricas.
E jamais tão bem se anestesiaram as pretensões de gosto
com esta coisa tão simples
que é como que bondade,
como que tristeza,
como que morte,
e é uma fúria de fugazmente viver,
sensível, inútil, condenada,
mas que sempre pungente viverá nesta música.
E, quando cai o pano sobre a morte de Mimi,
mal sonha a maioria dos espectadores conspícuos
a que ponto, com a lágrima no olho,
pagaram a conta do café aos Marcelos e aos Rudolfos,
e compraram sapatos mais largos a Museta.
E isto faz que perdoemos a Puccini tudo,
e lhe concedamos o lugar que merece em nós
como o coração que perdemos, e ele,
sem vergonha e sem escrúpulos,
nos restitui.
26/7/1964
Jorge de Sena in Arte de Música
Julgo que não será necessário descrever detalhadamente o argumento da Bohéme. Quem não estiver bem dentro do assunto, poderá sempre consultar um dos inúmeros sites sobre ópera que facilmente se encontram através do Google.
Gostaria que ouvissem a célebre área de Mimi-“Si, mi chiamano Mimi”- e o dueto “O suave fanciulla”.
(Para situar a acção, apenas uns breves dados: Mimi, vizinha de Rudolfo, bate à porta deste porque a sua vela se apagara. Rudolfo convida-a a entrar e dá-lhe um copo de vinho para a reanimar, pois Mimi estava quase desfalecida. Ao levantar-se para sair, ela descobre que perdeu a chave. Rudolfo encontra-a facilmente, mas mete-a no bolso para ter um pretexto para reter Mimi. Então toca-lhe na mão, que está muito fria, e canta a área “Che gelida manina”, na qual faz a sua apresentação, e que termina com as palavras “Chi siete? Vi piace dirlo?”
Respondendo a Rudolfo, “Si, mi chiamano Mimi”, é agora a vez de Mimi se apresentar, dizendo o seu nome e falando da sua vida e gostos.
Seguidamente, os dois cantam o dueto “O suave fanciulla” e saem juntos, acabando assim o 1º Acto.)
A área começa com o “tema de Mimi”, que irá percorrer toda a ópera associado a esta personagem, e que se ouve durante os primeiros versos.
Depois, com a frase “mi piaccion quelle cose” ouve-se um novo tema de sabor oriental (atenção ao trilo de flautas seguido de um acorde mais forte).
Há depois uma pequena pausa, durante a qual Mimi faz uma pergunta “ Lei m’entende?” e recebe a resposta de Rudolfo “Si”.
Seguidamente volta o “tema de Mimi”, logo seguido por outro de carácter pastoral, apropriado à descrição que ela faz da sua vida simples.
Dá-se então o clímax da peça e volta-se a ouvir, por momentos, o tema oriental. A área acaba de um modo suave com duas frases faladas.
Área de Mimi interpretada por Maria Callas:
O dueto é baseado no tema já antes utilizado nas áreas anteriores.
Dueto “O suave fanciulla” interpretado pelo casal A. Gheorghiu/R. Alagna:
Link para o site de Angela Gheorghiu (pode ouvir-se no site a parte do clímax da Área de Mimi)
8 Comments:
Obrigada pelas palavras carinhosas, Pamina. Fizeram-me um bem que não imaginas. E o vosso blog continua a ser uma delícia! Beijinho grande.
Pamina,faço minhas as palavras da Mitsou(Olá Mitsou!).
É mesmo um blog que é uma delícia...não me podiam ter dado nada melhor(hoje,precisava dessa paz.)Obrigada e beijinhos para ti e Viktor.
Pois é, querida Ni, quem se quer bem sempre se encontra :) E, Pamina, se já gostava de ti, ainda gosto mais por saber que não pisas os caracóis. Beijinho grande. E outro para o Viktor.
Again? Temos que divulgar este blog...não achas Mitsou?
Olá "vizinha",boa noite e beijinhos.
:))) Concordo, Ni.
Eu ando com falta de tempo; mas sempre que posso venho aqui "beber" desta fonte porque a minha sede é enorme. Lacunas...
Bem hajas, Pamina. Beijos muitos!
Pamina, também eu faço minhas as palavras da Mitsou e da Ni.
O blog é mesmo delicioso.
Beijinho
Gosto muito de música, mas não de escrever. Mas posso partilhar alguns dos meus links. Pode ser?
Por exemplo, esta ficha de estudo sobre "La Bohéme":
http://www.operaintheheights.org/Boheme%20Study%20Guide.doc
Cara Mi,
Obrigado pela visita e por ter deixado este link sobre Puccini e a Bohème. Volte sempre.
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